top of page

 

Minha caverna

​​

Encontrei uma caverna. Vazia. Ainda era dia e dei uma boa olhada por dentro dela. Não tinha senão uma entrada. Era segura como esconderijo, mas não seria segura se me descobrissem ali, porque tem apenas uma saída, a que serviria de entrada ao intruso.

Nestes tempos solitários não é difícil discernir quem veio para matar... No entanto, é preciso ser muito engenhoso para identificar quem veio para, sem me matar, extrair de mim toda a potência e vitalidade. E eu ficaria no dilema entre deixar entrar na minha caverna confortável e acolhedora ou conter, na entrada, a ameaça.

É muito bom ter a companhia de alguém, conversar sobre os pensamentos, rir... A parte ruim desses intrusos é ouvir críticas corrosivas, conselhos falsos, alertas maldosos que vêm para retirar a espontaneidade da minha vidinha, e me orientar ao encolhimento solitário primeiro, para depois condicionar meu relaxamento à presença de tais e quais intrusos, como se estes fossem o elixir contra o medo...

Melhor encontrar um companheiro que tem instinto mais aguçado que o meu e que me entenda e que me proteja. E eu a ele. Melhor encontrar um abrigo novo, que não provoque a sanha de intrusos.

​

A noite cai, ajeito os papelões que fui recolhendo ao longo do dia enquanto caminhava pela rua vazia neste domingo. Hoje foi possível amontoar um bom naco acima do chão frio... A caixa maior vai servir de teto e paredes. É verdade que teria sido mais seco e confortável naquela caverna... mas o cobertor conseguido há pouco na casa do padre está limpo. Sempre está. E a janta foi farta e esquentou. Eu e o Trovão. Esta noite vai ser boa. Trovão e eu vamos dormir bem juntinhos para um esquentar o outro. Que felicidade! Pança cheia e amigo para esquentar. Minha caverna está na medida para nós. Daqui não saio, daqui ninguém me tira! Nem eu nem o meu companheiro intuitivo, Trovão.

​

FIM

​

bottom of page